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sábado, 2 de maio de 2009

NÃO DIGAS QUE NÃO TE AVISEI

Se a velha diz que vais quase nua
Não faças caso
Deixa-a falar
Se o pintas manda bocas na rua
Não ligues peva
Manda-o lixar

Se a vizinhança fizer escarcéu
E te ameaça
Mandar prender
Põe-te bonita de perna ao léu
Diz ‘ma chalaça
Fá-la sofrer

Deixa as etiquetas, dá corda aos sapatos, não temos as 7 vidas dos gatos
Deixa as etiquetas, dá corda aos sapatos, não temos as 7 vidas dos gatos

Se o cão de fila te quer filar
Manda-lhe um osso
Manda-o buscar
Se o mais reguila te convidar
Vai-lhe ao pescoço
Põe-te a ladrar

Depois, não digas que não te avisei!

Se as catatuas vão à igreja
Meter umas cunhas
Pra te salvar
É porque já estão verdes de inveja
Roendo as unhas
Pra não pecar

Depois, não digas que não te avisei!

Se a esperança um dia bater à porta
Faz-lhe um café
Manda-a sentar
Pois até os peixinhos da horta
Com muita fé
Conseguem nadar

Se vires que o caso está mal parado
Só armadilhas
Em contratempo
Agarra o braço ao teu namorado
E põe-te a milhas
Enquanto é tempo

Depois, não digas que eu te avisei!

Música: José Peixoto

6 comentários:

Batom e poesias disse...

Sinto-me devidamente avisada.

Adorei o verso das catatuas que roem as unhas pra não pecar...

Abraço
Rossana

Mário Lopes disse...

A subtileza final "depois, não digas que eu te avisei", o tom popular. Como o João Monge nos "ensina", sempre ligado aos pequenos/grandes factos do dia-a-dia, transportando-os com carinho e com a dose certa de ironia, mordacidade e elegância para os seus poemas-retratos perfeitos deste nosso tempo. Revendo-se e revendo-nos neles. Dá-nos um imenso prazer lê-los. Apetece dizer:

Os conselhos do João Monge
Feitos de sabedoria popular
Já vêm de muito longe
Mas fez bem em nos avisar

gloria disse...

João,

eu fui sendo levada pela cadência do aviso que perde para irreverência. esta parte fala de um tipo de mulher que deixa rastro por onde passa:

Se as catatuas vão à igreja
Meter umas cunhas
Pra te salvar
É porque já estão verdes de inveja
Roendo as unhas
Pra não pecar

Isso não tem aviso, apenas a esperança pode surpreender. Atravessando a porta da espera.

você é um cancioneiro da vida corriqueira e, por isso mesmo, encantadora.

bjs

André Sebastião disse...

Dos que eu gosto mais são destes que aliam a sua inteligente visão critica da vida, a esse estilo poético que vai expondo o tema com todo esse cuidado e estrutura.
Mais destes... e depois "Não Digas que não te avisei"

Paula Raposo disse...

Com fé até os peixinhos da horta nadam...gostei!! Beijos.

San disse...

os avisos são uma coisa tramada...

;)