Às vezes fico tenso,
fico “penso, logo é triste”
fico sem voz e sem gosto
Com vontade de morder
as tuas maçãs do rosto
até chegar ao caroço.
Ser o arrepio do osso,
cobra de água de cisternas,
subir pelas tuas pernas,
provocar um alvoroço
Ser o dono da risada,
do ai-ai, não digas nada,
que eu tropeço na vontade
Mando às malvas a prudência,
ganho fama na cidade
Mas acabo mastigando,
remoendo e relembrando
o sabor da existência
Às vezes, fico leve,
fico “penso, logo é breve”
fico solto de alegria
E as tuas maçãs do rosto
Penso, logo já mordia!
É o assobio da cobra,
que se dobra e se desdobra,
na redonda melodia
E tu dizes «Já sabia!
Já sabia que caía»
No mar da tua risada,
no ai-ai, não digas nada,
que eu tropeço na vontade,
mando às malvas a prudência,
ganho fama na cidade
Mas acabo mastigando,
remoendo e relembrando
o sabor da existência
Música: Manuel Paulo
8 comentários:
Uma delícia de poema, de uma sinceridade desarmante! E com que graça o João Monge eleva à qualidade de poesia a confissão destes "pequenos" pensamentos e intenções comuns a todos nós! É um regalo...
Uma das minhas canções preferidas do albúm, esta e a casa inacabada não me canso de ouvir.
Um beijo
ai a tentação da cobra...
Tenho dificuldade em dizer algo que esteja ao nivel da beleza e da qualidade dos magnificos versos do João Monge.
Mais do que falar sobre eles, apetece-me relê-los ouvi-los ... é o que vou voltar a fazer...
Gosto desta cobra, maçã e dessa vontade que passa nas tuas palavras!! Beijos.
essa vontade de brincar de amar em mordidas, assobios, risadas e movimentos me traz a imagem de um corpo aberto em festa. Teus poemas falam de dança, como já te escrevi por aqui, do balanço cadenciado do corpo que se move em constante linguagem de celebração. bjs e parabéns!
Ai esta cobra!...
Quem não arrisca a ser cobra acaba por nunca chegar ao caroço.
E não sabe o que perde...
Enviar um comentário