Moro numa casa inacabada
feita de terra molhada
com o céu às cavalitas
Entra, mas desculpa a confusão;
anda tudo pelo chão,
não contava com visitas
Comigo mora gente tão diferente
que às vezes, pontualmente,
só falamos por sinais;
Cada um tem na sua bagagem
um bilhete de passagem
pelos pontos cardeais
Na sala, uma velha cartomante
lê ao cavaleiro errante
um destino vencedor;
As cartas falam de perdas e danos
Para, no correr dos panos,
encontrar o seu amor
Ao fundo, dorme um soldado sisudo
com umas botas de faz-tudo
e uma paixão de aluguer;
O bêbado que está no quarto ao lado
chora sempre em tom de fado
o amor de uma mulher
Aquela que tem o corpo na esquina
diz que também foi menina
Há-de um dia ser feliz
O homem que a usou pelos quintais,
como é norma entre iguais,
compreende o que ela diz
Em cima fica o quarto dos amantes,
dos poetas, viajantes
e dos loucos sem lugar;
Pintaram um baloiço na janela
com a luz de uma aguarela
para a Lua baloiçar
Assim somos vizinhos de outras crenças,
de outros livros e sentenças
Outras formas de oração;
Mas quando a noite traz os seus momentos
escapa destes aposentos
um bater de coração
Revela-se a verdade nua e crua:
Chove mais do que na rua
Trago o fato ensopado
Aqui qualquer um é vagabundo,
esta casa é todo o mundo
Falta só pôr o telhado
Música: Manuel Paulo
6 comentários:
este é mesmo demasiado lindo!é mesmo algo que nos faz estremecer!
Brilhante, Mestre. Uma das tuas coisas mais lindas!
Maravilhoso. Apaixonante.
Um xi-coração enorme.
MMM
Olha... é lindo.
Um beijo e pronto.
Lena
O meu palavreado foi-se...
e olha que é difícil, até os cotovelos se calaram!
Na ponhas! Perdia a graça.
Além de que, depois, o céu andaria às cavalitas de quem?
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